domingo, 21 de agosto de 2011

Probabilidade Bayesiana 2

                Até agora  foram os conceitos básicos necessários para o entendimento do teorema de Bayes. É um teorema importante para a prática clínica porque, quando aplicado à medicina, diz que para sabermos qual a capacidade de um teste confirmar ou descartar uma doença ou  de saber quais as chances de um achado estar correto, depende não apenas da sensibilidade e da especificidade do exame, mas também da probabilidade da doença ou achado serem encontrados no paciente antes do teste. Um dos dados mais importantes para sabermos qual a probalidade pré-teste de uma doença em um paciente é a prevalência.
                Prevalência é o número ou proporção de casos existentes numa determidade população num período de tempo. Isso permite ter uma idéia do quanto é comum ou rara uma doença. Como exemplo temos a hipertesão arterial(pressão alta) que é uma das doenças mais comuns entre as pessoas. Segundo a VI Diretrizes Brasileiras de Hipertensão a prevalência nos últimos 20 anos apontou uma prevalência acima de 30%, ou seja, se tomarmos toda a população brasileira,  mais de 3 em cada 10 pessoas tem essa doença.
                O valor preditivo  positivo refere-se à probabilidade de uma pessoa apresentar uma doença se um teste dar positivo e o valor preditivo negativo refere-se à probabilidade de uma pessoa não ter uma doença se um teste der negativo.
                Vamos a alguns exemplos para facilitar a compreesão. No exemplo da postagem anterior do fictício aparelho que verifica se alguém tem a cor dos olhos verdes, temos que a sensibilidade do teste é de 95% e especificidade é de 93,75%. Se aplicarmos esse aparelho à população de um prédio com 100 pessoas que tenha a prevalência de 30 pessoas com olhos verdes,  teremos os seguinte resultados:
                Com uma sensibilidade e 95%, o aparelho detectará 28,5 pessoas com olhos verdes e deixará de perceber 1,5 pessoa, enquanto pela especificidade de 93,75%, veremos que o aparelho dará como sendo alguém com olhos verdes sem ter esta cor de olhos em apenas 4,375 casos.  O aparelho deu positivo em 32,875 casos, estando correto, portanto em 86,69% dos casos. Este é o valor preditivo positivo. O aparelho deu como negativo em 67,125 casos, estando correto em 97,76 casos. É um ótimo resultado, acreditem. Sucesso.
                Agora mudaremos aprevalência de olhos verdes nesse prédio. Suponhamos que seja de apenas 5 %. Nesse caso teremos 5 pessoas com olhos verdes e 95 com olhos de outra cor. Multiplicando 90% por 5, teremos 4,5 pessoas com resultado positivo e 0,5 com resultado negativo, embora na verdade tenha olhos verdes. Já para as pessoas com olhos de outra cor, teremos que  89,0625 pessoas terão o resultado correto negativo e 0,9 pessoa terá o resultado positivo sem terem a cor verde. O aparelho, neste caso específico, considerou como positivo 1,4 pessoas, o que significa que acertou em 0,357% dos casos (seu valor preditivo positivo) e que seu valor preditivo negativo é de 99,44% dos casos. Este resultado é ótimo, mas para o resultado positivo  é péssimo. Aliás, apenas conhecendo a prevalência, sem olhar para os olhos das pessoas, basta chutar qualquer cor diferente de verde para todo mundo do prédio e acertaremos em 90% das vezes. Neste exemplo, o teste é ótimo para excluir a cor verde, mas se der positivo não há como saber a cor dos olhos usando apenas o aparelho.
                Isso significa que quanto maior a chance da doença estar presente num paciente antes do teste ser realizado, maior a confiabilidade do resultado positivo de um exame. Por outro lado, quanto menor a chance da doença existir em um paciente antes dele realizar um exame, menos confiável é um resultado positivo. Todo esse raciocínio também é válido quando a probabilidade de uma doença ser presente é muito alta antes do exame. Nesse caso a chance do resultado negativo passa a ser comprometido, mesmo que o exame não acuse a doença, se um médico tiver uma alta suspeita, há um aumento de chance do resultado estar errado.
                Tudo que foi dito não tem nada a ver com incompetência do profissional, do aparelho, ou de qualquer coisa dessa natureza, é inerente à própria medicina, pois ela é uma ciência bastante baseada em probabilidades e estatísticas. Sabemos como  uma população funciona, mas é muito difícil afirmar algo especificamente para uma única pessoa.
                Estes números todos são apenas para melhorar o entendimento de todo processo diagnóstico e não se aplicam exatamente no mundo real, pois a sensibilidade, especificidade e prevalência dos exames e testes não são exatos, pois dependem de vários fatores difíceis de serem isolados. A probabilidade de alguém ter uma doença calculada na mente de um médico vai variando conforme a consulta e o resultado não é um número exato, é mais algo como baixa, média e alta probabilidade de ocorrência. A mensagem é que muito do resultado correto de um exame depende do médico e do seu raciocínio antes dos testes. Na próxima postagem reforçarei este conceito, mas abordando a influência do conceito de normal para o resultado incorreto.

Desabafo de hoje: mais vale um médico bom do que mil exames desnecessários.

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