quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Modalidades de imagem



"Que legal Dr., este exame de imagem é colorido!"

     Não é incomum um radiologista ouvir isso, talvez menos nos dias atuais, mas ainda acontece, embora eu não esteja muito certo do que quer dizer essa frase. Acho que as pessoas fazem uma associação com a televisão e o cinema, em que nos seus primórdios era tudo preto e branco e com o avanço da tecnologia imagens ganharam mais cores. Talvez as pessoas pensem que o mesmo ocorra com os exames, porém não é assim que funciona.
    

     O sentido que utilizamos para a avaliação dos exames de imagem é a visão, contudo essas imagens não são produzidas originalmente pela luz. Nós entendemos como cores uma faixa específica de onda eletromagnética que vai de infravermelho a ultravioleta, isso é o que vemos e chamamos de luz. Os feixes com energias mais altas ainda são chamadas de raios-X e radiação gama.

     Os seres humanos enxergam graças aos olhos que são capazes de serem estimulados pela luz e transformar esse estímulo em informação decodificada no cérebro, portanto se não houver o estímulo, não há visão e muito menos cores.

     Os exames de imagem tem como métodos a radiografia, a tomografia computadorizada, a ultrassonografia e a ressonância magnética. Tanto a radiografia quanto a tomografia computadorizada tem as imagens produzidas pela emissão de raios-x, enquanto na ultrassonografia emitimos sons de alta frequência e na ressonância magnética usamos poderosos campos magnéticos para fazer estímulos com radiofrequência.

     O que todos eles tem em comum é que ultilizamos alguma fonte de estímulo e observamos a resposta dos diferentes órgãos e tecidos do corpo humano. Os raios-X são absorvidos ou espalhados de forma diferente em diversas partes do paciente. Já a ultrassonografia depende do grau de reflexão e refração do som. Deixando a física um pouco de lado, facilita entender que alguns tecidos deixam passar mais raios-X ou ultrassom do que outros.

     Imagine que uma pessoa fará uma radiografia do tórax. Para fazer isso emitimos um feixe de raios-X dirigido para a área estudada que deverá atravessar os diferentes tecidos do corpo humano para chegar a um filme posicionado atrás do paciente. No tórax os múltiplos fótons que compõem o feixe passarão por diferentes trajetos e obstáculos, alguns passarão por músculo, outros por músculo e osso, outros por músculo, pulmão e osso, outros quase que apenas por osso, e assim vai. Quanto mais fótons o filme radiográfico receber, mais exposto será o filme, e as regiões com menos raios-X serão menos expostas. A região do pulmão, por exemplo, será uma das regiões que mais permitirá a passagem dos feixes eletromagnéticos, pois contém ar em grande quantidade, enquanto as regiões dos ossos, principalmente a coluna vertebral, serão as regiões com menos exposição por conterem cálcio. Atualmente existe a radiografia digital que pode prescindir dos filmes radiográficos, mas a ideia é a mesma.

     Já na tomografia computadorizada usamos os mesmos raios-X porém de um modo bastante sofisticado em que os raios são emitidos de diferentes ângulos para o corpo sendo captados por múltiplos detectores ao redor. Isso vai gerar um grande volume de dados mostrando quanto do feixe de raios-X foi atenuado em qual ângulo e em que posição em relação ao eixo longitudinal do corpo do paciente. Tudo isso gera uma matriz de dados que é transformada pelo computador em imagens seccionais.

    Para a realização do exame de ultrassom ultilizamos aparelhos chamados de transdutores que possuem cristais emissores de sons de alta frequência inaudível à orelha humana. Este feixe sonoro se propaga pelo corpo humano sofrendo refração e reflexão dependendo do tecido com que se depara. Parte desse som volta para o transdutor que o capta e o transforma em sinal que, por sua vez, é transformado em imagens numa escala de cinza (de branco a completamente preto) dependendo de quanto um tecido permitiu a passagem do som a uma certa distância. Os líquidos transmitem melhor o som enquanto o osso e o ar refletem o mesmo. Quanto maior a distância do órgão a ser availado em relação ao transdutor, maior o tempo que demora para o som emitido voltar e com isso temos os dados das distâncias e profundidade dos tecidos visibilizados.

     A ressonância magnética é mais complicada. Eu particularmente acho que o protótipo desse aparelho foi encontrado numa espaçonave alienígena e durante as investigações perceberam que o efeito colateral do uso dessa máquina era produzir imagens fantásticas do corpo humano, mas só eu penso assim, então ignore. Ninguém gosta muito de física, mas provavelmente piso num terreno seguro se eu presumir que o leitor sabe o que é um átomo e que eles são formados por diferentes combinações de números de prótons, elétrons e neutrons. Pois bem, se o número de nêutrons e prótons for diferente, isso cria um momento magnético: imagine um minúsculo imã dentro do corpo. Como existem muitos e muitos deles e cada um aponta para um lugar diferente, é necessário que o corpo humano seja submetido a uma campo magnético milhares de vezes maior que o do planeta para que eles fiquem unifomes e possamos adquirir dados sobre os órgãos do paciente. Uma vez submetido a este campo desejado, a maquinaria sofisticada faz uma série de mudanças e capta as alterações que ocorrem. Nós utilizamos o átomo de hidrogénio para os estudos, pois é o elemento mais comum no nosso organismo. A água, proteínas e gorduras tem o hidrogénio ligado a diferentes elementos e formam estruturas espaciais únicas que permitem sua diferenciação. As calcificações e cortical óssea geralmente não possuem hidrogênio, portanto são identificadas como ausência de sinal. Esses dados são codificados e transformados em pixels numa escala de cinza, formando as imagens.

     Quanto maior a passagem de raio-X ou de ultrassom, mais para perto do preto será codificado uma estruturas e quanto menor a passagem, mais perto do branco. Contudo, isso é uma padronização. Se achássemos que as imagens ficariam melhores, poderíamos inverter isso. Na realidade na era digitalizada é fácil fazê-lo pelo compudador.

     Mesmo no ultrassom quando o exame é realizado com estudo Doppler colorido não existe cor de fato, são sinais captados pela máquina e decodificados como cor para facilitar nossa avaliação. Para o Doppler colorido usa-se uma escala de vermelho e azul, enquanto no power Doppler a escala é de amarelo e laranja. Utilizam-se cores nesse caso para destacar o sinal do Doppler em relação às imagens do ultrassom convencional que aparecem na escala de cinza. Ficaria muito mais difícil analisar se fosse uma escala de cinza do Doppler sobreposta nas imagens em escala de cinza do ultrassom convencional. Usa-se escala de cores diferentes para a tratografia e perfusão na ressonância magnética e no PET-CT que é a junção das imagens da medicina nuclear com as imagens da tomografia computadorizada. Nestes casos também as cores servem para destacar diferentes imagens unificadas numa única.

     A maioria dos aparelhos de ultrassom hoje em dia permitem mudar a escala de cinza para outras escalas como de azul, vermelho, amarelo, sépia, etc. Muitos já devem ter percebido essa mudança nas cores quando vêem os exames de 3D, outro tópico que causa muita confusão aos leigos que acham que esta modalidade sempre aumenta a acurácia do exame, portanto é algo a se desejar. Não é assim na gigante maioria das vezes, mas isso fica para outra postagem. O mesmo para a tomografia e ressonância magética, é possível mudar a cor das imagens se alguém achar que fica mais bonito.

     A mesma ideia serve para o Doppler espectral que é quando ouvimos, por exemplo, o batimento cardíaco de um feto durante o ultrassom. O aparelho não é um superamplificador que capta o som produzido dentro do corpo humano. O som produzido pela máquina também é uma decodificação do sinal que ele capta.

     Esta postagem pretendeu introduzir os diferentes métodos de imagem e mostrar que elas não representam a realidade como a percebemos no nosso dia a dia através dos nossos sentidos, mas são codificações de fenômenos extrassensoriais. Na próxima postagem discutirei sobre a pergunta "qual exame é o melhor?".

Desabafo do dia: não pergunte se o exame é melhor porque é colorido.

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